Hoje é dia de homenagear os quadrinhos brasileiros! Dia 30 de janeiro é o dia das histórias em quadrinhos nacionais (HQs). A escolha da data se deve ao fato de ter sido em 30 de janeiro de 1869 a publicação da primeira história de quadrinhos brasileira: ‘As aventuras de Nhô-Quim’, título dado à sequência, contava a saga de um jovem caipira de 20 anos que visita a corte do Rio de Janeiro”, autoria do cartunista Angelo Agostini. A partir de 1984, ficou instituído, através da “Associação dos Quadrinistas e Cartunistas do Estado de São Paulo” (AQC-ESP), que todo o dia 30 de janeiro se comemoraria o Dia do Quadrinho Nacional, em homenagem ao trabalho de Agostini.
Nataniel Gomes, professor da UEMS, líder do Núcleo de Pesquisa em Quadrinhos (NuPeQ), afirma que há uma confusão com relação à data e esclarece: “Dia 30 de janeiro é o dia em que é comemorado o Dia dos Quadrinhos Brasileiros e às vezes há muita confusão neste sentido, porque comemoramos o Dia dos Quadrinhos Nacionais e muita gente confunde com o Dia Nacional dos Quadrinhos. Em 1984 a Associação dos Quadrinistas e Caricaturistas de São Paulo realizou uma pesquisa na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e verificou que o Brasil é pioneiro na publicação de quadrinho. A gente tem Angelo Agostini, que era um ítalo-brasileiro que começou a publicar em 1867 seus desenhos no jornal em São Paulo e depois ele foi para o Rio de Janeiro e criou o seu jornal Vida Fluminense. Eu tenho um artigo numa revista da USP em que eu defendo, a partir dos critérios que eu utilizo, que o Angelo Agostini é o primeiro quadrinista do mundo, antecipando em alguns anos os quadrinhos estadunidenses. A questão é que os quadrinhos estadunidenses tinham uma circulação infinitamente maior, publicados em diversos jornais, a mídia muito maior. O Dia dos Quadrinhos Brasileiros tem esse apelo por causa do dia 30 de janeiro de 1869 quando o Agostini começou a publicar o primeiro quadrinho dito brasileiro, que foi ‘As aventuras de Nhô-Quim ou impressões de uma viagem à corte’. Eram páginas duplas que mostravam este personagem Nhô-Quim viajando de Minas Gerais para a corte no Rio de Janeiro. Este ano Nhô-Quim completa 155 anos. Depois disso, a Associação de Quadrinistas e Caricaturistas de São Paulo levou esta documentação de pesquisa aos órgãos responsáveis para conseguir que este dia 30 de janeiro entrasse no calendário oficial do Dia do Quadrinho Nacional, isso foi em 1985. Por isso que se estabeleceu esta data”.
O professor Nataniel tem uma história bastante afetiva com relação aos quadrinhos. As histórias em quadrinhos entraram na vida dele na infância como uma leitura colorida. “No meu caso foram os super-heróis com toda aquela coisa do super poder, da super aventura, de poder realizar coisas inimagináveis, de poder lutar contra a tirania, a desigualdade e etc. Comecei a me tornar um colecionador na década de 1980, um leitor voraz que lia tudo e isso trouxe algumas vantagens, como por exemplo, aquela ciência popular ou pseudociência que era divulgada nos quadrinhos e fazia discutir ou querer conhecer outras coisas às quais as pessoas não tinham acesso. Algumas referências da literatura que eu li quando tinha 7, 8, 9 anos de idade por causa dos quadrinhos me fizeram buscar a obra original que tinha sido referenciada nos quadrinhos. Então me abriu um leque para inúmeras possibilidades”.
E com o passar do tempo Nataniel foi identificando também que os quadrinhos eram uma arte. “Não só uma arte como o cinema, o teatro, a literatura, mas como características muito próprias. E eu queria entender porque eles faziam tanto sucesso, porque cativavam, se era só a questão da imagem, ou do ritmo. Eu comecei a pesquisar os quadrinhos agora como pesquisador, cientista, investigador, tem uns 20 anos. Em Mato Grosso do Sul a partir de 2012. Uma coisa que me chamou a atenção é que o Brasil é proeminente nessas pesquisas. Em 1951 nós tivemos o primeiro evento internacional de quadrinhos no mundo, que foi uma exposição organizada entre outros nomes pelo Álvaro de Moya. Somente na década de 1960 que você tem uma mudança neste sentido com intelectuais europeus que começaram a enxergar este gênero como um gênero a ser investigado. E na década de 1970 há o Primeiro Congresso Internacional dos Quadrinhos”.
Sobre os quadrinhos em Mato Grosso do Sul, ele diz que artistas que produzem HQs estão cada vez mais presentes por aqui. “Gente que mora em Mato Grosso do Sul e tem produzido quadrinhos não só com a pegada regional, com olhares para a história regional, mas com outros temas mais universais são bastante comuns. Há uma produção bastante rica neste sentido de artistas aqui na região que têm conseguido visibilidade, ganhado prêmios, têm estudado, têm se dedicado a fazer isso. Além disso, o grupo de pesquisas que eu lidero junto com o professor Daniel Abrão, ele se tornou referência nacional. No Centro-Oeste com certeza, tem bastante visibilidade, isso porque a gente realiza pelo menos dois a três eventos reunindo pesquisadores do Brasil inteiro. Nas bancas de TCC, mestrado ou doutorado, muitas vezes nós vemos pesquisadores conhecidos nacionalmente de grandes instituições para participar conosco e nós estamos participando também. Ou seja, hoje nós temos dissertações nesta área, algumas feitas de capa a capa no formato de quadrinhos, as possibilidades são inúmeras””.
Olímpio Leme teve recentemente um projeto aprovado pelo Fundo de Investimentos Culturais, que foi a publicação dos quadrinhos “Garcia, luta fé e justiça, sobre o personagem Garcia Sete Orelhas, o Januário Garcia Leal. Olímpio é bancário, quadrinista e desenhista e desenha desde os dois anos de idade. “Eu sempre consumi muito revista em quadrinhos. Meu pai era arquiteto e ele me presenteava muito com revistinhas de leitura, Turma da Mônica, livro dos Irmãos Grimm, literatura clássica, e ele também me presenteava com livros de bolso. Aprendi a ler com cinco anos de idade e sempre gostei de ler, e com o passar do tempo eu comecei a pegar algumas revistas da DC Comics e eu ficava doido porque eu pegue numa época em que o pessoal começou a fazer histórias mais sérias. Isso me deixou muito impressionado com esta linguagem, com esta forma de se comunicar. Você ter a parte escrita e a parte desenhada”.
Olímpio gosta muito da linguagem em preto e branco e o que o inspira a criar é a sua família. “Com o passar do tempo fui me aprimorando, estudando, sempre fui autodidata. Sou formado em Economia, trabalho em banco mas nunca larguei essa minha faceta com a arte. Eu sou muito inspirado principalmente por todo o trabalho a nanquim, jogo de luz e sombra, positivo e negativo, isso é uma das coisas mais lindas que tem. Às vezes eu chego a preferir um bom quadrinho preto e branco a um colorido por conta da nitidez, daquilo que ele mostra nas histórias. Uma das coisas que me inspira muito é a parte da minha família, o meu pai, que sempre me estimulou a essa leitura da arte, da arte clássica, da arte moderna, das várias facetas. Toda arte é importante, toda representatividade, esse ambiente diverso que a arte abarca, que ela complementa, eu acho importante. Quando eu desenho, eu lembro do meu pai e da minha mãe como forma de lembrança, porque já são falecidos”.
A sua trajetória artística começou há dez anos, quando foi convidado por um outro artista, Alexandre Leone, pra fazer um fanzine. “Eu comecei lá atrás desenhando em folha sulfite mesmo e depois colocando a tinta nanquim. Aí depois eu fui me juntando a outras pessoas, teve um coletivo, o Bigorna Ilustrada, a gente fez outra história em quadrinho, e eu sempre tive vontade de contar uma história. Lá se vão 44 anos consumindo quadrinhos, então eu sempre tive no meu coração a vontade de fazer minha própria história, inclusive contando alguma coisa que fizesse referência à minha família. E quando eu tive oportunidade, há uns cinco anos, eu vi que poderia contar uma história que fosse vinculada a Mato Grosso do Sul, que era a história do Garcia. Era uma história que meu pai me contata quando eu era criança, e eu pensei, eu vou me prepara, juntar uma equipe para eu conseguir fazer esta obra. Até aqui foi o que realmente me motivou a fazer, alguma coisa que mostrasse a história do meu estado, da minha família, e eu mostrar um pouquinho do meu talento”.
O seu objetivo enquanto artista é contar, por meio dos quadrinhos, as lindas histórias que o estado de Mato Grosso do Sul nos traz. “A gente precisa mostrar o que a gente tem de bom aqui, e a história de Mato Grosso do Sul, como ele foi criado, como ele surgiu, é uma coisa que não é muito divulgada. Eu penso que eu sou um coletor de histórias, eu coleto histórias de famílias, e eu vejo que a amizade, a união, dos pioneiros, que conseguiu manter as pessoas aqui. Nós temos belos exemplos, situações lindas de desafios, de superação, que construiu Mato Grosso do Sul, e a minha vontade é mostrar essas histórias. As histórias em quadrinhos têm um papel fundamental para mostrar a nossa cultura, a nossa vivência, inclusive para que a gente possa ver, fazer um reconhecimento, e pegar essa cultura, essa visão e utilizar para que a gente possa se unir mais como povo, uma cultura única e, porque não, mostrar para fora, mostrar o nosso estado, cruzar fronteiras. Todo esse caminho que eu pretendo percorrer é exaltar o nome de Mato Grosso do Sul, mostrar que a gente é um povo unido, forte, que a gente supera dificuldades, levar uma mensagem de esperança, de alegria e de união”.
Texto: Karina Lima
Fotos: Acervo pessoal